segunda-feira, janeiro 27, 2014

Crônica do entardecer


O entardecer era o melhor horário. Ele costumava ficar ali parado apreciando algumas xícaras de café, soltando fumaça no ar e perdido em seus pensamentos. Era a única hora do dia que conseguia ter algum pensamento significante em sua vida. O que tornava aqueles momentos especiais – e de rara beleza.

Olhava para as montanhas enquanto o tempo passava vagarosamente. Algo raro naqueles dias. Entre um gole e uma baforada um pensamento inundava a sua cabeça: odiava ser passado. Talvez porque aquela condição deixava claro que não tinha as rédeas da vida. A verdade é que ninguém tem, mas acreditar no contrário era a sua ilusão favorita. Quem não gosta de achar que tem o controle sobre tudo?

Mas a verdade é que era passado. Não no sentido de que era arcaico – pelo contrário –, Ele se encaixava até bem no mundo que o rodeava e seguia bem em frente. O que o incomodava eram as lembranças que volta e meia o atormentavam. Histórias não vividas, saudade, desejo e solidão. Era o tipo de coisa que não conseguia se libertar.

Não era um sentimento de arrependimento. O que deixava tudo tão difícil de entender. Incompetência e impotência. Uma mistura de sensações que apontavam o rumo da sua vida até ali. Não saber lidar com a rotina a dois acabou por fazer com que Ela fosse embora. Agora não lhe restava muita coisa. A não ser o entardecer.

E a sensação de ser passado. E o que tem de tão terrível nisso? Em algum momento todo mundo será passado. Mas o que fazer quando você se torna passado enquanto a outra pessoa continua sendo o seu presente? Ele não tinha resposta e não saber como lidar com a própria vida o consumia aos poucos.

Trabalho, diversão, bebedeira, leitura... nada era suficiente para afastar os seus pensamentos dela. E não tinha nada que Ele pudesse fazer para mudar isso. Dizem que o tempo cura tudo. Ele começava a discordar veementemente dessa máxima. A única coisa que sabia era que deveria seguir em frente. Esperava que tudo se acalmasse e pudesse, quem sabe, voltar a sentir o seu coração tão quente quanto o café que bebia.

Atrás das montanhas o sol começava a se por. O café chegava ao fim e o cigarro já estava apagado no cinzeiro. Algumas coisas não mudam. Cada por do sol é diferente. Porém, o sol sempre vai se por. E Ele vai continuar sendo passado.

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